Comunicado divulgado pelo Exército Zapatista de Libertação Nacional (de Chiapas, México) em 9 de março passado, durante a marcha até a Cidade do México.

O trecho não está assinado, mas pode ter sido escrito pelo comandante Marcos

>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>

..."Estamos aqui, no quartel general zapatista, nós que somos parte desta

marcha pela dignidade indígena, a marcha da cor da terra.

Nós que aqui estamos já não estamos sós. Assim fala a força da terra que

aqui repousa para tornar-se passo amanhã:

Estamos aqui porque estamos tratando de corrigir um equívoco. Porque mandam

os nossos mais antigos antepassados que os de baixo corrijam o que os de

cima fazem de errado.

Este é o México.

A história deste país é uma história de equívocos.

Mas, até agora, são eles os que sempre erram e nós somos o equívoco e quem

paga por eles.

Se equivocaram há 500 anos dizendo que nos descobriam. Como se o outro

mundo que nós éramos tivesse ficado se perdido. Como se nós fossemos os que

estavam sendo procurados e não os que procuravam. Como se nós estivéssemos

quietos e eles fossem os que se mexiam.

Se equivocaram quando seus grandes sábios discutiam se tínhamos razão e

sentimento ou se éramos animais que eram muito pouco parecidos com eles.

Se equivocaram chamando de "civilizar" a ação de destruir, de matar, de

humilhar, de perseguir, conquistar, submeter.

Se equivocaram quando matar um indígena era chamado de "evangelizá-lo". Se

equivocam hoje quando chamam este assassinato de "modernizá-lo".

Para eles, nossas histórias são mitos, nossas doutrinas são lendas, nossa

ciência é magia, nossas crenças são superstições, nossa arte é artesanato,

nossos jogos, danças e roupas são folclore, nosso governo é anarquia, nossa

língua é dialeto, nosso amor é pecado e baixaria, nosso andar é arrastar-se,

nosso tamanho é pequeno, nosso físico é feio, nossa maneira de ser é

incompreensível.

Para olhar-nos, eles olham para trás e para baixo.

Para eles, reconhecer-nos é reconhecer eles mesmos como superiores.

Para eles, ver-nos é ver-nos submissos.

Para eles, olhar-nos é mandar em nós.

Para eles, dar-nos um lugar é apontar-nos o túmulo, a prisão, o

esquecimento.

Eles, os que estão acima de nós que estamos em baixo.

Ontem eles nos "civilizaram" e hoje querem nos "modernizar".

Eles nos dizem que o mundo deles é melhor.

Que devemos abandonar a nossa terra, nossa casa, nossa história.

Que devemos ir à terra deles e viver debaixo dela.

Que devemos viver na casa deles e servir nela.

Que devemos ser parte de sua história e morrer nela.

Eles nos oferecem isso: viver debaixo dos seus pés, obedecer à sua vontade,

morrer no esquecimento...

(...Irmãos e irmãs

Eles querem que nossas derrotas sejam perpétuas.

Eles querem que nossas vitórias sejam derrotas.

Quando são eles os que perseguem, prendem e matam, é a lei. Quando somos nós

é crime.

Quando eles governam é democracia. Quando nós governamos é anarquia.

Quando eles exigem é justiça. Quando nós exigimos é rebelião.

Quando eles mandam é paz. Quando nós mandamos é guerra.

Quando eles falam é pra atender. Quando nós falamos é pra tampar os ouvidos.

Quando eles mandam é a estabilidade. Quando nós mandamos é um terremoto.

Seus meios de comunicação emitem um chiado, mas não para nós. E sim para

eles mesmos. Dizem e se dizem: „que idiotas são estes indígenas e estão

sozinhos! Que fortes nós somos e quantos somos! Contam isso a seu favor

porque a porta que fecham é a que os deixa de fora.

Não cabemos no mundo deles, a não ser que sejamos mudos, quietos, mortos.

Temos que falar se queremos ser a cor da terra que somos. Temos que nos

mexer, temos que viver.

Para falar, mexer e viver, precisamos de nós mesmos, não deles.

Para falar, nos mexemos.

Para mexer, nos falamos.

Para viver, nos mexemos e falamos.

Para falar e mexer, vivemos.

Que o dinheiro trema porque falamos. Que trema porque nos mexemos, que

trema, enfim, porque vivemos.

No fim das contas, ao viver, falar e mexer, é isso que gritamos: somos nós

mesmos!

E somos nós mesmos com todos, e com todos devemos ser reconhecidos.

Porque, apesar deles, com todos, todos teremos...

Democracia!

Liberdade!

Justiça!

>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>

Tradução:

Emilio Gennari

 

Exército Zapatista de Libertação Nacional: www.ezln.org

 

Solidariedade Imediata

sim<info@imediata.com>

 

Comandante Marcos