Carta Aberta de Cientistas dirigida a todos os governos a respeito dos Organismos Geneticamente Modificados (OGMs)

* Os cientistas estão extremamente preocupados com os perigos que os OGMs representam com relação à biodiversidade, segurança alimentar, saúde dos seres humanos e dos animais, e exigem uma moratória na difusão desses organismos no ambiente, em conformidade com o princípio de prevenção e precaução.

* Eles se opõem às culturas GM que vão intensificar o monopólio corporativo, agravar a condição de desigualdade e prevenir que ocorra uma mudança no sentido de uma agricultura sustentável que possa fornecer segurança alimentar e saúde em todo o mundo.

* Eles conclamam que sejam banidas as patentes relativas a formas de vida e processos biológicos que ameaçam a segurança alimentar, que aprovam a biopirataria dos conhecimentos indígenas e dos recursos genéticos e que violam os direitos humanos básicos e a dignidade.

* Eles querem mais apoio para a pesquisa e o desenvolvimento de uma agricultura não-corporativa e sustentável que pode beneficiar as pequenas unidades familiares de agricultores em todo o mundo.

Versões prévias da presente carta foram submetidas a muitos governos e fóruns internacionais, incluindo:

* A Conferência da Organização Mundial do Comércio (OMC) em Seattle (30 de novembro 30 — 2 dezembro de 1999)

* O Encontro sobre o Protocolo de Biosegurança da ONU em Montreal (24 — 28 de janeiro 2000)

* A Conferência da Comissão de Desenvolvimento Sustentável da ONU em Nova York (24 de abril — 5 de maio de 2000)

* A Conferência da Convenção sobre a Diversidade Biológica da ONU em Nairóbi (16 — 24 de maio de 2000)

* O Congresso dos Estados Unidos da América (29 de Junho de 2000)

 

Assinado por (agrupado por países) 410 cientistas de 55 países, incluindo:

 

Dr. David Bellamy, Biologist and Broadcaster, London, UK

Prof. Liebe Cavalieri, Mathematical Ecologist, Univ. Minnesota, USA

Dr. Thomas S. Cox, Geneticist, US Dept. of Agriculture (retired), India

Dr. Tewolde Egziabher, Spokesperson for African Region, Ethiopia

Dr. David Ehrenfeld, Biologist/Ecologist, Rutgers University, USA

Dr. Vladimir Zajac, Oncovirologist, Genetisist, Cancer Reseach Inst, Czech Republic

Dr. Brian Hursey, ex FAO Senior Officer for Vector Borne Diseases, UK

Prof. Ruth Hubbard, Geneticist, Harvard University, USA

Prof. Jonathan King, Molecular Biologist, MIT, Cambridge, USA

Prof. Gilles-Eric Seralini, Laboratoire de Biochimie & Moleculaire, Univ. Caen, France

Dr. David Suzuki, Geneticist, David Suzuki Foundation, Univ. British Columbia, Canada

Dr. Vandana Shiva, Theoretical Physicist and Ecologist, India

Dr. George Woodwell, Director, Woods Hole Research Center, USA

Prof. Oscar B. Zamora, Agronomist, U. Philippines, Los Banos, Philippines

 

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9 de janeiro de 2000

 

Carta Aberta de Cientistas do Mundo Todo Dirigida a Todos os Governos

Sumário

Nós, os cientistas abaixo-assinados, conclamamos pela suspensão imediata de todas as difusões no meio-ambiente de culturas e produtos Geneticamente Modificados, tanto comercialmente quanto em testes em campo aberto, por um período de pelo menos 5 anos; que as patentes relativas a processos, organismos, sementes, linhas de células e genes sejam revogadas e banidas; e que sejam efetuadas investigações públicas abrangentes quanto ao futuro da agricultura e a segurança alimentar para todos.

As patentes relativas às formas de vida e aos processos biológicos deveriam ser banidas porque constituem uma ameaça à segurança alimentar, aprovam e homologam a biopirataria de conhecimentos indígenas e de recursos genéticos, violam os direitos humanos básicos e a dignidade, comprometem os cuidados com a saúde, impedem a pesquisa médica e científica e vão contra o bem-estar dos animais.

As culturas GM não oferecem qualquer benefício aos agricultores ou consumidores. Ao invés disso, muitos problemas já foram identificados, incluindo prejuízos à safra, aumento no uso de herbicidas, irregularidades no desempenho e baixos retornos econômicos para os agricultores. As culturas GM também intensificam o monopólio corporativo de produtos alimentares, o que está levando as unidades agrícolas familiares à pobreza, e impedindo a mudança essencial no sentido de uma agricultura sustentável que pode garantir a segurança alimentar e a saúde em todo o mundo.

Os perigos dos OGMs à biodiversidade e à saúde humana e dos animais já são reconhecidos por fontes governamentais do Reino Unido e dos EUA. Conseqüências particularmente sérias estão associadas ao potencial para transferência horizontal de genes. Isso inclui a difusão de genes de resistência antibiótica que tornariam incuráveis as doenças infecciosas, a geração de novos tipos de vírus e bactérias que causam doenças, e as mutações perigosas que podem levar ao câncer.

No Protocolo de Biosegurança de Cartegena, negociado em Montreal em janeiro de 2000, mais de 130 governos se comprometeram solenemente no sentido de implementar o princípio preventivo e de garantir que as legislações sobre a biosegurança a nível nacional e internacional tenham precedência sobre os acordos financeiros e comerciais da Organização Mundial do Comércio.

Estudos sucessivos documentaram a produtividade e os benefícios sociais e ambientais de uma prática agrícola sustentável, orgânica e utilizadora de um baixo nível de recursos, tanto para o Norte quanto para o Sul. Esses estudos oferecem o único modo prático para recuperar as terras agrícolas degradadas pelas práticas agrícolas convencionais, e dão condição às unidades agrícolas familiares de combater a miséria e a pobreza.

Exortamos veementemente o Congresso dos EUA a rejeitar as culturas GM, pois são perigosas e vão contra os interesses das unidades agrícolas familiares; e a apoiar a pesquisa e o desenvolvimento de métodos agrícolas sustentáveis que podem beneficiar verdadeiramente os pequenos agricultores em todo o mundo.

Nós, os cientistas abaixo-assinados, conclamamos pela suspensão imediata de todas as formas de difusão no meio-ambiente de culturas e produtos Geneticamente Modificados, tanto comercialmente quanto em testes em campo aberto, por um período de pelo menos 5 anos; que as patentes de processos, organismos, sementes, linhas de células e genes sejam revogadas e banidas; e que sejam efetuadas investigações públicas abrangentes quanto ao futuro da agricultura e a segurança alimentar para todos.

 

  1. As patentes relativas às formas de vida e aos processos biológicos deveriam ser banidas porque constituem uma ameaça à segurança alimentar, aprovam e homologam a biopirataria de conhecimentos indígenas e de recursos genéticos, violam os direitos humanos básicos e a dignidade, comprometem os cuidados com a saúde, impedem a pesquisa médica e científica e vão contra o bem-estar dos animais(1). As formas de vida tais como organismos, sementes, linhas de células e genes são descobertas e, portanto, não são passíveis de ser patenteadas. As técnicas GM atuais, que exploram os processos de vida, não são confiáveis, são incontroláveis e imprevisíveis, e não podem ser qualificadas de invenção. Além disso, essas técnicas são inerentemente inseguras, assim como o são a maioria dos organismos e produtos GM.

2. Está ficando cada vez mais claro que as culturas GM atuais não são nem necessárias nem benéficas. Elas constituem um perigoso desvio, impedindo a mudança essencial no sentido de práticas agrícolas sustentáveis que podem efetivamente fornecer segurança alimentar e saúde em todo o mundo.

3. Duas características simples descrevem quase 40 milhões de hectares de plantações GM, semeadas em 1999(2). A maioria (71%) são resistentes a um amplo espectro de herbicidas, com as companhias construindo geneticamente plantas que sejam resistentes às suas próprias marcas de herbicidas, ao passo que a maioria das restantes são construídas com toxinas-bt para matar insetos nocivos que causam pragas. Uma pesquisa universitária de 8.200 testes no campo de uma das culturas GM mais conhecidas — os grãos de soja resistentes a herbicidas — revelou que elas rendem 6,7% a menos e requerem de duas a cinco vezes mais herbicida do que as variedades não-GM(3). Esse dado foi confirmado por um estudo científico recente na Universidade de Nebraska(4). Ainda outros problemas foram identificados: desempenho irregular, suscetibilidade a doenças(5), aborto de frutas(6) e parcos retornos para os agricultores (7).

4. Segundo o programa de alimentação da ONU, há comida suficiente para alimentar mais de uma vez e meia a população do mundo. Enquanto a população mundial cresceu 90% nos últimos 40 anos, a quantidade de comida per capita aumentou 25%; ainda assim, um bilhão de pessoas passam fome(8). Um novo relatório da FAO confirma que haverá uma quantidade de alimentos mais do que suficiente para satisfazer as demandas globais, isso sem considerar as melhorias que poderiam resultar de colheitas GM, até o ano de 2030 (9). É devido ao monopólio corporativo crescente, operante sob uma economia globalizada, que os pobres estão ficando cada vez mais pobres e famintos(10). As unidades agrícolas familiares em todo o mundo têm sido levadas à pobreza e ao suicídio, devido às mesmas razões. Entre 1993 e 1997, o número de plantações de porte médio nos EUA caiu para 74.440 (11), e os agricultores agora estão recebendo menos do que o custo médio de produção pelos seus produtos(12). A população agrícola da França e Alemanha caiu em 50% desde 1978 (13). No Reino Unido, somente no ano passado, foram perdidos mais de 20.000 empregos no setor agrícola e o Primeiro Ministro anunciou um pacote de ajuda de £200m (14). Quatro corporações controlavam 85% do comércio mundial de cereais no fim de 1999 (15). E as fusões e aquisições continuam.

5. As novas patentes de sementes intensificam o monopólio corporativo, impedindo que os agricultores possam economizar e replantar as sementes, o que é feito pela maioria dos agricultores no Terceiro Mundo. Para proteger suas patentes, as corporações continuam a desenvolver tecnologias do tipo "terminator", onde as sementes das colheitas produzidas pela engenharia genética não germinam, apesar da ampla oposição mundial dos agricultores e da sociedade civil(16).

6. Christian Aid, uma das principais associações caritativas do Terceiro Mundo, concluiu que as plantações GM causarão desemprego, agravarão a dívida do Terceiro Mundo, ameaçarão os sistemas agrícolas sustentáveis e prejudicarão o meio-ambiente. Ela também prediz fome para os países mais pobres(17). Os governos africanos condenaram a reivindicação da Monsanto de que os OGMs são necessários para alimentar a fome do mundo: "Nós condenamos veementemente que a imagem dos pobres e famintos de nossos países seja usada pelas corporações multinacionais gigantes para forçar o uso de uma tecnologia que não é segura, não beneficia o ambiente nem nos beneficia economicamente… acreditamos que ela destruirá a diversidade, o conhecimento local e os sistemas agrícolas sustentáveis que nossos agricultores desenvolveram há milênios, além de destruir a nossa capacidade de auto-suficiência na produção de nossos alimentos.(18)" A mensagem do Movimento Camponês das Filipinas à Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico dos países industrializados afirma: "A entrada dos OGMs certamente intensificará a condição da população sem terra, a fome e a injustiça.(19)"

7. Uma coligação de grupos de pequenos agricultores dos EUA distribuiu uma lista de demandas abrangentes, incluindo o banimento de propriedade sobre qualquer forma de vida, a suspensão de vendas, difusão ambiental e aprovações adicionais de qualquer cultura e produtos GM antes que sejam avaliados de forma independente e abrangente os impactos que causam nas variáveis econômicas, sociais, ambientais, e relativas à saúde; e para que as corporações sejam responsabilizadas por todos os danos decorrentes das culturas e produtos GM no gado e rebanhos, seres humanos e meio-ambiente(20). Eles também exigem uma moratória para todas as fusões e aquisições, o fechamento de fazendas, e um ponto final nas políticas que servem os interesses dos grandes negócios agrícolas, às custas dos pequenos agricultores, contribuintes e meio-ambiente(21). Eles começaram uma ação legal contra a Monsanto e outras nove corporações, acusando-as de práticas monopolistas e por "forçar" sementes GM a agriculturas, sem que tivessem sido feitas avaliações adequadas sobre o impacto das mesmas na segurança e no ambiente.

8. Alguns dos perigos das culturas GM são abertamente reconhecidos pelos governos do Reino Unido e dos EUA. O Ministério da Agricultura, Pesca e Alimentação do Reino Unido [UK Ministry of Agriculture, Fisheries and Food (MAFF)], admitiu que a transferência de culturas e pólen GM para além dos campos cultivados é um fato inevitável(23),.e isso já resultou em plantas resistentes a herbicidas(24). Um relatório de ínterim sobre os testes de resistência a herbicidas promovidos pelo governo do Reino Unido confirmou a hibridização entre terrenos adjacentes plantados com diferentes variedades de sementes de colza GM resistentes a herbicidas , o que gerou híbridos resistentes a múltiplos herbicidas. Além disso, a colza GM e seus híbridos foram encontrados como voluntários em safras subsequentes de trigo e cevada, as quais tiveram que ser controladas por herbicidas padrão(25). Os insetos nocivos resistentes a Bt evoluíram, como resposta à presença contínua de toxinas em plantas GM, no decorrer da estação de plantio, e o Departamento para a Proteção Ambiental dos EUA (US Environment Protection Agency) está recomendando aos agricultores que plantem até 40% de sementes não-GM, de modo a criar um refúgio para os insetos nocivos não-resistentes.

9. A ameaça contra a biodiversidade representada pelas sementes GM já comercializadas está ficando cada vez mais evidente. Os herbicidas de amplo espectro usados com sementes GM resistentes a herbicidas dizimam espécies de plantas selvagens indiscriminadamente, além de ser tóxicos aos animais. O Glufosinato causa defeito de nascença em mamíferos(27), e o glifosato está ligado ao linfoma tono-Hodgin(28). As sementes GM com toxinas-bt matam insetos benéficos, tais como as abelhas(29) e os "lacewings"(30), e o pólen do milho-bt é letal para para as borboletas "monarch"(31), assim como para os fraques(32). A toxina-bt é dispersa a partir das raízes das plantas-bt na rizosfera, onde se mistura rapidamente a partículas de solo e se mantém protegida da degradação. Como a toxina está presente de modo ativado e não discriminado, ela afeta tanto as espécies-alvo como as demais espécies presentes no solo(33), o que provoca efeitos devastadores em espécies acima do nível do solo.

10. Os produtos resultantes de organismos geneticamente modificados também podem ser perigosos. Por exemplo, um lote de triptofan produzido por microorganismos GM foi associado a, pelo menos, 37 mortes e 1.500 doenças sérias(34). O hormônio de crescimento bovino geneticamente modificado, injetado nas vacas para aumentar a produção de leite, não só causa sofrimento excessivo e doenças nas vacas, como também aumenta o IGF-1 do leite, o qual está associado ao câncer da mama e da próstata em seres humanos(35). É vital que o público esteja protegido de qualquer produto GM, e não só aqueles que contêm DNA ou proteínas transgênicas. Isso porque o próprio processo de modificação genética, pelo menos na forma como é praticado atualmente, é inerentemente inseguro.

11. Memorandos confidenciais da US Food and Drug Administration (órgão controlador dos alimentos e medicamentos dos EUA), revelaram que ela ignorou as advertências de seus próprios cientistas, de que a engenharia genética é um novo ponto de partida, introduzindo novos riscos. Além disso, o primeiro lote de cultura GM a ser comercializado — o tomate Flavr Savr — não passou nos testes toxicológicos requeridos(36). Desde então, nenhum teste científico abrangente sobre a segurança foi efetuado, até que o Dr. Arpad Pusztai e seus colaboradores, no Reino Unido, levantaram sérias questões sobre a segurança das batatas GM que estavam testando. Eles concluíram que uma parte significativa dos efeitos tóxicos pode ser devida à "arquitetura [do gene] ou à transformação genética (ou a ambas)" utilizadas para produzir as plantas GM(37).

12. A segurança dos alimentos GM foi abertamente questionada pelo Professor Bevan Moseley, geneticista molecular e, atualmente, Presidente do Working Group on Novel Foods (Grupo de Trabalho sobre os Alimentos Novos) da Comissão Científica para os Alimentos da União Européia(38). Ele chamou a atenção para os efeitos imprevisíveis inerentes à tecnologia, enfatizando que a próxima geração de alimentos GM — os chamados ‘neutracêuticos’, ou ‘alimentos funcionais’, tais como o arroz ‘enriquecido’ de vitamina A — trarão ainda maiores riscos à saúde, devido à maior complexidade da arquitetura do gene.

13. A engenharia genética introduz novos genes e novas combinações de material genético arquitetado em laboratório nas plantações, gado/rebanho e microorganismos(39). Essas arquiteturas artificiais são derivadas do material genético de vírus patógenos e de outros parasitas genéticos, assim como de bactérias e outros organismos, e incluem a codificação de genes para resistência a antibióticos. Essas arquiteturas são concebidas para eliminar as barreiras entre as espécies e superar os mecanismos que previnem que o material genético estrangeiro se insira nos genomas. A maioria deles nunca existiu na natureza, no decorrer dos bilhões de anos de evolução.

14. Essas arquiteturas são introduzidas nas células através de métodos invasivos, que levam à inserção randômica de genes estrageiros ao interior dos genomas (a totalidade de todo o material genético de uma célula ou organismo). Isso leva à impossibilidade de previsão, a efeitos randômicos, incluindo anormalidades grosseiras em animais e toxinas e aparecimento de alérgenos inesperados nas culturas de alimentos.

15. Uma arquitetura comum a praticamente todas as culturas GM já comercializadas ou em fase de teste em campo envolve um (promotor) comutador de gene, a partir do vírus mosaico da couve-flor (CaMV), entrançado a um gene estrangeiro (transgene) de modo a produzir uma transferência rápida continua(40). Esse promotor CaMV encontra-se ativo em todas as plantas, germes que causam a fermentação, algas e E. coli. Recentemente, descobrimos que se encontra ativo até em ovos de anfíbios(41) e extrato de célula humana(42). Ele tem uma estrutura modular, e é intercambiável, em parte, ou no todo, com promotores de outros tipos de vírus, para produzir vírus infecciosos. Ele também apresenta um ‘ponto crítico de recombinação’, onde está sujeito a quebrar e a juntar-se a outros materiais genéticos(43).

16. Por essas e outras razões, o DNA transgênico — a totalidade das arquiteturas artificiais transferidas nos OGMs - podem ser mais instáveis e sujeitas a novas transferências a outras espécies não relacionadas, e a potencialmente todas as espécies que interagem com os OGM(44).

17. A instabilidade do DNA transgênico em plantas GM é bem conhecida(45). Os genes GM são frequentemente silenciados, mas a perda de uma parte ou da totalidade do DNA transgênico também ocorre, mesmo no decorrer de gerações subsequentes de propagação(46). Desconhecemos qualquer evidência publicada sobre a estabilidade a longo prazo das inserções GM em termos da estrutura ou localização no genoma da planta em qualquer uma das linhas GM já comercializadas ou que estão sendo submetidas a testes no campo.

18. Os perigos potenciais da transferência horizontal de genes GM incluem a difusão de genes de resistência antibiótica a patógenos, a geração de novos tipos de vírus e bactérias que causam doenças e mutações devidas à inserção randômica de DNA estrangeiro, alguns dos quais podem levar ao câncer em células de mamíferos(47). A habilidade do promotor CaMV de funcionar em todas as espécies, incluindo os seres humanos, é particularmente relevante quanto aos perigos potenciais da transferência horizontal de genes.

19. A possibilidade de que o DNA nu ou livre seja incorporado a células de mamíferos é explicitamente mencionada nos princípios orientadores da US Food and Drug Administration (FDA) ao setor, com relação aos genes de resistência antibiótica(48). Comentando o documento da FDA, o MAFF do Reino Unido destacou que o DNA transgênico pode ser transferido não somente por ingestão, mas por contato com o pó e o pólen das plantas transportado pelo ar, durante o trabalho no campo e o processamento de alimentos(49). Essa advertência se torna bem mais significativa no relatório recente da Universidade de Jena, na Alemanha: os experimentos decampo indicaram que os genes GM podem ter sido transportados via pólen GM a bactérias e germes que causam a fermentação dentro das larvas das abelhas(50).

20. O DNA de plantas não se degrada prontamente no decorrer da maioria dos processamentos de alimentos comerciais(51). Os procedimentos tais como a moagem e a trituração deixaram os grãos de DNA amplamente intactos, assim como o tratamento a calor a 90 graus C. As plantas colocadas em silos mostraram poucos sinais de degradação do DNA, e um relatório especial do Reino Unido, o MAFF, desaconselha o uso de plantas GM ou restos dessas plantas na alimentação de animais.

21. A boca dos seres humanos contém bactérias que demonstraram incorporar rapidamente DNA nu contendo genes de resistência antibiótica, e bactérias transformáveis similares estão presentes nas vias respiratórias(52).

22. Foi constatado que os genes de resistência antibiótica das plantas GM se transferem horizontalmente para as bactérias e os fungos do solo, em laboratório(53). O monitoramento no campo revelou que o DNA da beterraba GM persistiu no solo por um período de até dois anos depois que as sementes GM tinham sido plantadas. E há evidência de que partes do DNA transgênico se transferiram horizontalmente a bactérias no solo(54).

23. Pesquisas recentes em terapia genética e vacinas de ácido nucléico (tanto DNA quanto RNA) deixam pouca dúvida de que os ácidos nucléicos/ nus podem ser tomados, e em certos casos, incorporados ao genoma de todas as células de mamíferos, incluindo aquelas dos seres humanos. Efeitos adversos já observados incluem choque tóxico agudo, ocorrência de reações imunológicas retardadase e reações autoimunes(55).

24. A British Medical Association, em seu relatório de ínterim (publicado em maio de 1999), solicitou uma moratória por prazo indefinido das difusões de OGMs, em pendência de pesquisas adicionais sobre as novas alergias, a difusão de genes de resistência a antibióticos e os efeitos do DNA transgênico.

25. No Protocolo da Biosegurança de Cartegena, negociado com sucesso em Montreal em janeiro de 2000, mais de 130 governos concordaram em implementar o princípio preventivo, e garantir que as legislações relativas à biosegurança, a nível nacional e internacional, sejam prioritárias relativamente aos acordos comerciais e financeiros da Organização Mundial do Comércio. Similarmente, delegados participantes da Conferência da Comissão do Codex Alimentarius, em Chiba, no Japão, março de 2000, concordaram em preparar procedimentos regulamentares estritos para os alimentos GM, os quais incluem a avaliação desses alimentos antes de sua comercialização, o monitoramento relativo aos seus impactos na saúde a longo prazo, os testes para a estabilidade genética, toxinas e alérgenos, e outros efeitos não intencionais(56). O Protocolo de Biosegurança de Cartegena já foi assinado por 68 governos em Nairóbi, em maio de 2000.

26. Nós conclamamos todos os governos a levar em conta a substancial evidência científica atual e os perigos suspeitos que decorrem da tecnologia GM e de muitos de seus produtos, e a impor uma moratória imediata nas difusões ambientais adicionais, incluindo testes em campo aberto, em conformidade com o princípio de prevenção, assim como de acordo com uma ciência saudável.

27. Estudos sucessivos documentaram a produtividade e a sustentabilidade das unidades agrícolas familiares no Terceiro Mundo, assim como no Norte(57). Evidência tanto no Norte quanto no Sul indica que as pequenas culturas são mais produtivas, mais eficientes e contribuem mais para o desenvolvimento econômico do que as unidades maiores. O pequeno agricultor também tende a utilizar melhor os recursos naturais, conservando a biodiversidade e salvaguardando a sustentabilidade da produção agrícola(58). A resposta de Cuba à crise econômica precipitada pelo desmantelamento do bloco soviético em 1989, foi converter-se de uma produção em grande escala convencional, de uma monocultura utilizadora de muitos recursos a plantações orgânicas ou semi-orgânicas de pequeno porte; com isso dobrou a produção de alimentos utilizando apenas a metade dos recursos (59).

28. Métodos agro-ecológicos representam grandes perspectivas para uma agricultura sustentável nos países em desenvolvimento, à medida que combinam o conhecimento de técnicas agrícolas locais e técnicas ajustadas às condições locais, junto com o conhecimento científico ocidental contemporâneo (60). As safras dobraram e triplicaram, e continuam aumentando. Estima-se que 12,5 milhões de hectares no mundo todo estejam sendo plantados com sucesso desta maneira (61). É bom para o meio-ambiente e economicamente acessível para os pequenos agricultores. Oferece o único modo prático de recuperar as terras agrícolas degradadas pelas práticas agrícolas intensivas convencionais. Principalmente, possibilita que as unidades agrícolas familiares possam combater a pobreza e a fome.

29. Nós exortamos todos os governos a rejeitarem sementes GM, com base no fato de que elas são perigosas e contrárias a um uso ecologicamente sustentável dos recursos. Ao invés disso, os governos deveriam apoiar a pesquisa e o desenvolvimento de métodos agrícolas sustentáveis que podem verdadeiramente beneficiar os pequenos agricultores em todo o mundo.

assinada por 411 cientistas de 55 países

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N.T.: a referência bibliográfica, as notas e a lista de cientistas e respectivos cargos e títulos se encontram no original em inglês. Favor referir-se ao website da i-sis.org

-The Institute of Science in Society:

http://www.i-sis.org/

 

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Versão em português da Carta Aberta sobre os Organismos Geneticamente Modificados (OGMs)

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