O que está por trás das manobras dos EUA no Iraque

 

 


Matt Siegfried
CounterPunch

29 de agosto de 2002

Tradução Imediata

O governo dos Estados Unidos está preparando uma nova guerra contra o Iraque. Um setor da administração Bush, refletindo um setor da classe dominante dos EUA, tem insistido num ataque ao Iraque para depor o regime de Sadaam Hussein. Não causa surpresa a ninguém que esse grupo esteja intimamente associado ao petróleo e, em menor grau, às indústrias do setor militar. O atual vice-presidente, ex-secretário da defesa e ex-dirigente da Halliburton Corporation Dick Cheney é o principal representante desses interesses na administração.

Halliburton, com um valor nominal de mercado superior aos 18 bilhões de dólares, é a maior fornecedora de petróleo em todo o mundo. A empresa também se tornou uma das mais importantes contratantes do setor da construção para o setor militar dos EUA, desde o início da administração Bush. Se a Chevron-Texaco (a qual batizou um navio com o nome da Assessora para a Segurança Nacional de Bush, Condoleezza Rice) precisar de partes na Nigéria ou de novos poços de petróleo no Ártico, a Halliburton estará lá. As pistas de decolagem e aterrissagem de onde saem os caças-bombardeiros americanos que atingem as festas de casamento afegãs e os campos de prisioneiros no território ocupado de Cuba foram construídas pela Halliburton.

Não se trata de uma conspiração, nem de uma coincidência — mas de como funciona o capitalismo americano. O governo vê como seu papel primário o de defender e ampliar os interesses corporativos americanos. Há uma porta giratória permanente entre o governo e os negócios nos EUA. Essa, naturalmente, não é uma realidade exclusivamente americana, mas de todos os governos capitalistas do mundo.

Utilizando o estado de espírito belicoso da atmosfera pós-11 de setembro, a direita dos EUA fez um esforço conjunto para convencer o governo a declarar uma nova Guerra do Golfo. Os ‘falcões’ têm estado em ascendência desde o início da primavera, embora não sem contradições e oposição real de outros setores da classe dominante, do governo e dos militares que temem algumas das consequências de uma nova guerra. Essas consequências incluem a possibilidade de uma alta nos preços do petróleo e a pressão inflacionária que atingiria a já perturbada economia; a ulterior desestabilização de uma região já em ebulição devido à "Guerra contra o Terrorismo", as sanções que continuam no Iraque, e o apoio dos EUA a Israel; e o esgotamento dos recursos de um exército de "voluntários" do qual se exige cada vez mais, entre outros motivos.

As forças que defendem uma nova guerra também têm divisões entre si. Algumas delas querem vingança pelas suas próprias falhas em desalojar Sadaam Hussein durante a última guerra e a continuação de sua existência no poder, depois de todas as tentativas feitas durante a última década de isolá-lo e substitui-lo. Um pouco como a raiva do valentão da sala-de-aula depois que suas tentativas de intimidação durante o recreio não chamaram a atenção de ninguém. O valentão deixa de sê-lo, quando os demais passam a menosprezar suas intimidações.

Outra motivação é que os EUA têm escassos resultados para mostrar em sua "Guerra contra o Terrorismo". Até agora, o Mulá Omar e Osama bin Laden não têm colaborado e não entregaram os seus cadáveres para a foto da vitória com os troféus. Embora os imperialistas tenham, obviamente, obtido muitos ganhos no Afeganistão, a guerra do procura-procura-e-não-acha-nada parece ter perdido o seu ímpeto, sem que muitas das importantes questões tenham sido resolvidas a seu favor. Uma guerra contra o Iraque desviaria as acusações de falta de "severidade" com relação à Al Qaeda e ao Eixo do Mal, da parte da direita dos EUA e, coincidentemente, de alguns democratas. Quando outros inimigos se mostram excessivamente evasivos, a estrela nefasta de Sadaam tende a se levantar na psique do governo dos EUA. Eles parecem murchar quando não têm um inimigo para comparar com Hitler.

Outra motivação é o petróleo, e não somente o petróleo ao interior das fronteiras do Iraque. Enquanto os alvos estritamente econômicos são, as vezes, simplisticamente expostos como as razões principais por trás da política de guerra dos EUA, e todos os partidários da guerra têm uma combinação de motivos para a sua defesa, seria maluco subestimar o poder dos interesses do petróleo na configuração da política americana. A competição entre os poderes imperialistas para o acesso e o controle do petróleo tem aumentado, desde o colapso da União Soviética.

Um dos motivos desse fato é que os recursos previamente inacessíveis da União Soviética agora estão acessíveis, conduzindo a um novo "Grande Jogo" com relação às reservas dos estados da Ásia Central (agora, convenientemente, abrigando as bases militares dos EUA para a guerra no vizinho Afeganistão) e do Mar Cáspio. Porque deixar todo esse petróleo aos russos e aos asiáticos centrais? A privatização das velhas companhias estatais de energia é uma potencial dádiva do céu de muitos bilhões de dólares para os interesses de petróleo americanos, desde que as novas companhias façam parcerias com as empresas americanas e atualizem suas instalações com partes e know-how da Halliburton Corporation.

Outra razão é que o velho equilíbrio entre as potências imperialistas frente à comum ameaça soviética acabou, significando que é provável que cada uma dessas potências persiga seus próprios objetivos de energia, incluindo o acesso direto ao petróleo. É isso que está no centro da oposição da França às sanções ao Iraque. Enquanto muitos países compram petróleo da Iraq Petrochemical Company (IPC, nacionalizada em 1972), a França é a única potência ocidental que detém propriedade parcial da IPC. As sanções lhe impedem maximizar a exploração desse relacionamento.

Os EUA e a Grã-Bretanha, em conjunto, contando com quatro entre as cinco mais importantes companhias de petróleo do mundo, foram mantidos fora dos investimentos na IPC e, portanto, fora do controle de mais de 10 porcento do petróleo do mundo, o qual é produzido pelo Iraque. Em função disso, será que causa qualquer surpresa que esses dois países sejam os mais inflexíveis para continuar as sanções e agora, declarar guerra, seja quais forem as consequências para o povo iraquiano?

O Japão e a Alemanha quase não têm recursos petrolíferos indígenas, de forma que a segunda e a terceira economias do mundo têm que comprar o acesso ao mercado do petróleo. Embora a riqueza desses países lhes permita o acesso, eles ainda estão confinados, militarmente, aos seus próprios países, como consequência da 2a Guerra Mundial. Assim, eles continuam dependentes dos EUA para proteger seu acesso ao petróleo. Para os EUA, o controle do petróleo significa poder sobre os seus aliados, que são também seus rivais. Na maior conta de energia da história, os EUA fizeram a Alemanha e o Japão desembolsarem dezenas de bilhões de dólares para o petróleo do Kuait, durante a última Guerra do Golfo. A recessão e os problemas políticos internos tornam a Alemanha e o Japão muito menos propensos a repetir a experiência.

Os mais belicosos mercenários no governo dos EUA vêem o controle do petróleo como o ponto de partida de suas respectivas políticas, mais do que o regime de Sadaam Hussein. Quando olham os mapas do mundo eles vêem os recursos e as zonas de influência, mais do que os países e as pessoas. Com tudo o que ocorreu durante a última década, eles vêem uma necessidade urgente de reconfigurar partes do mundo segundo seus próprios interesses e, em virtude de pertencerem à única superpotência, quase uma obrigação predestinada de fazê-lo.

Essa não é uma atitude nova na administração Bush. As intervenções "humanitárias" da administração Clinton estavam baseadas na mesma visão arrogante, a qual considera que o Oriente Médio é demasiadamente importante para ser deixado ao seu próprio povo. O objetivo desse grupo "patrício" é impor a Pax Americana na região. Os custos e as consequências dessa idiotice brutal só pode ser imaginado, mas a destruição que Israel está infligindo aos palestinos é um bom lugar para começar.

O petróleo iraquiano é parte da motivação. Geralmente, o petróleo é uma motivação maior. Mas a raiz dessa atitude de cowboy do governo corrente dos EUA é a natureza do capitalismo e do imperialismo em geral, praticado por quem quer que seja. Ou seja, a imposição violenta dos interesses de poucos, os governantes das "grandes potências" capitalistas, sobre a vasta maioria da humanidade. As vidas arruinadas de muitos estão por trás do lucro e do poder de poucos.

Nós, os povos trabalhadores do mundo, não somos simplesmente "as massas exploradas" por quem se deve ter compaixão. Nós somos um poder que, através da luta pelos nossos próprios interesses, lutamos pela liberação de toda a humanidade. As crises estão, atualmente, fazendo tremer continentes, em função das consequências dos últimos vinte e cinco anos de cruzada neoliberal.

De Jacarta a Buenos Aires, de Johannesburg a Jenin, de Seattle a Gênova, as pessoas têm marchado sob a bandeira do "Um Outro Mundo É Possível". É hora de dar um nome a esse outro mundo: socialismo, e diante de ainda outra guerra americana programada, urgentemente, mudar esse mundo. Para a utilização comum, racional e compartilhada daquilo que a natureza, finitamente, concedeu ao planeta, em outras palavras, pelo socialismo.

Os trabalhadores, as "massas exploradas" também existem nos EUA, embora em geral muito mais silenciosamente do que no resto do mundo. Os trabalhadores dos EUA precisam entrar nessa luta com suas próprias vozes, mais do que através daquelas vozes que preferem falar por elas. Que os EUA tenham se decidido pela guerra não torna a mesma inevitável, e quanto mais alto falarmos agora, tanto maior será a chance que temos de preveni-la. Se eles conseguirem declarar a guerra deles, nós nos oporemos a eles. Se eles triunfarem em seus planos, nós demonstraremos a perfídia da vitória deles e usaremos as lições aprendidas para resistirmos à próxima guerra, a qual sabemos que virá, seguramente. As guerras fazem parte da natureza do imperialismo e precisamos insistir nessa realidade — derrotar a guerra é preciso para derrotar o capitalismo.

Matt Siegfried escreve para a revista irlandesa Forthwrite. Pode ser contactado no endereço eletrônico: almata@hotmail.com

 

 

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August 29, 2002

What's Behind the US War Moves on Iraq?

by Matt Siegfried

The United States government is preparing a new war on Iraq. A section of the Bush administration, reflecting a section of the US ruling class, has long been pursuing an assault on Iraq to overthrow the regime of Sadaam Hussein. It will come as no surprise to anyone that this group is intimately associated with the oil and, to a lesser extent, the military industries. Vice President and former Defense Secretary and chief of Halliburton Corporation Dick Cheney is the main representative of these interests in the administration.

Halliburton, at a nominal market value of over 18 billion dollars, is the largest oil supply company in the world. It has also become a leading construction contractor for the US military since the Bush administration took office. If Chevron-Texaco (which named a ship after Bush's National Security Adviser Condoleezza Rice) needs parts in Nigeria or new oil wells in the arctic wilderness, Halliburton is there. The runways that launch American bombing sorties on Afghan wedding parties and the prisoner camp in occupied Cuba are built by Halliburton.

This is not a conspiracy, nor is it a coincidence -- it is how American capitalism works. The government sees its primary role to defend and extend American corporate interests. There is a constant revolving door between government and business in the US. This, of course, is not a uniquely American reality but one shared with all the capitalist governments of the world.

Utilizing the bellicose mood of the post-September 11th political atmosphere, the US right wing has made a concerted effort to win the government to launching a new Gulf War. The hawks have been in the ascendancy since the early spring, though not without contradictions and real opposition from parts of the ruling class, government, and military who fear some of the consequences of a new war. These consequences include the prospect of a jump in oil prices and the inflationary pressure that would put on the already troubled economy; the further destabilization of a region already seething from the "War on Terrorism", continued sanctions on Iraq, and US patronage of Israel; and strains on an increasingly active "volunteer" army's resources, to name a few.

The forces advocating a new war also have divisions among them. Some of them want revenge for their own failure to dislodge Sadaam Hussein in the last war and his continued existence in power after all the attempts made over the last decade to isolate and replace him. This looks and sounds a bit like the red-faced rage of the schoolyard bully whose attempts at intimidation go unheeded. He cannot remain the bully if others refuse to be bullied.

Another motivation is that the US has awfully little to show in its "War on Terrorism". Mullah Omar and Osama bin Laden have, so far, been unwilling to offer up their corpses for a trophy photo. Though the imperialists have clearly won many gains in Afghanistan, the all-looking-and-no-finding war seems to have powered down without many of the big issues being resolved in their favor. A war on Iraq would deflect charges of being "soft" on Al Qaeda and the Axis of Evil from the far right of American politics and, coincidently, some Democrats. When other enemies prove too elusive, Sadaam's nefarious star tends to rise in the US government's psyche. They seem to wilt without an enemy to compare to Hitler.

Another motivation is oil, and not just the oil within the borders of Iraq. While strictly economic aims are sometimes simplistically laid out as the primary reasons behind US war policy, and all the proponents of war have a combination of reasons for their advocacy, it would be foolish to underestimate the power of oil interests in shaping American policy. Competition among the imperialist powers over access to and control of oil has increased since the collapse of the Soviet Union.

One reason for this is that the previously off-limits resources of the former Soviet Union have opened up, leading to a new "Great Game" for the riches of the Central Asian states (now conveniently hosting US military bases for the war in neighboring Afghanistan) and the Caspian Sea. Why leave all that oil to the Russians and the Central Asians? The privatization of the old state energy companies is a potential windfall of many billions of dollars for American oil interests, provided that the new companies partner with US ones and upgrade their facilities with the parts and know-how of the Halliburton Corporation.

Another reason is that the old equilibrium between the imperialist powers facing a common Soviet threat has broken down, meaning that each is more likely to pursue its own energy goals, including direct access to oil. This is what is at the heart of France's opposition to the sanctions on Iraq. While many countries buy oil from the Iraq Petrochemical Company (IPC, nationalized in 1972), France is the only Western power which has partial ownership in the IPC. The sanctions prevent them from fully exploiting that relationship.

The US and Britain, with four of the top five oil companies in the world between them, were frozen out of investment in the IPC and therefore out of control over 10 percent of the world's oil, which is produced by Iraq. Is it really any surprise then that these two countries are the most adamant about continuing the sanctions and now about going to war, whatever the consequences for the Iraqi people?

Japan and Germany have almost no indigenous oil resources, so the second and third largest economies in the world have to buy their way into the oil market. While their wealth provides them access, they are still confined militarily to their own countries as a consequence of World War II. Thus they remain beholding to the US to protect their oil access. For the US, control of oil means power over its friends, who are also its rivals. In the largest gas bill in history the US made Germany and Japan cough up tens of billions of dollars for their Kuwaiti oil in the last Gulf War. Recession and political problems at home make Germany and Japan much less willing to do this again.

The more mercenary warmongers in the US government see control over oil as the starting point of their policy, rather than the regime of Sadaam Hussein. When they look at maps of the world they see resources and zones of influence, rather than countries and people. With all that has happened in the last decade they see an urgent need to reshape parts of the world in their own interests and, by virtue of being the only superpower, almost the ordained obligation to do so.

This attitude is not new with the Bush administration. The "humanitarian" interventions of the Clinton administration were rooted in the same arrogant view, which holds that the Middle East is too important to be left to its people. The goal of this patrician group is to impose a Pax Americana on the region. The costs and consequences of such brutal folly can only be guessed at, but the destruction Israel is inflicting on the Palestinians is a good place to start.

Iraqi oil is part of the motivation. Oil in general is a greater motivation. But the root of the cowboy attitude of the current US government is the nature of capitalism and imperialism in general, whoever practices it. That is, the violent imposition of the interests of the few, the rulers of the capitalist "great powers", on the vast majority of the world's people. The ruined lives of the many underlie the profit and the power of the few.

We, the working people of the world, are not simply "exploited masses" to be pitied. We are a power who, by fighting for our own interests, fights for the liberation of all humanity. Crisis are currently shaking continents from the consequences of the last twenty years of Neo-Liberal's crusade.

From Jakarta and Buenos Aires, from Johannesburg and Jenin, from Seattle and Genoa people have marched under the banner "Another World is Possible". It is time to give that world a name; socialism, and in the face of still another American war set about, urgently, to change this world. For the common, rational, and shared utilization of what nature, finitely, has endowed the planet, that is, for socialism.

Working people, the "exploited masses" also exist in the US, though usually more silently than in the rest of the world. US workers need to enter this struggle with their own voices rather than those voices who would speak for them. That the US has decided on war does not make it inevitable, and the louder we are now the greater chance we have to prevent it. Should they succeed in launching their war we will oppose them. If they triumph in their plans we will demonstrate the perfidy of their victory and use the lessons learned to resist the next war, which we are sure will come. Wars are in the nature of imperialism and we must press home this reality- to defeat war it is necessary to defeat capitalism.

Matt Siegfried writes for the Irish magazine Forthwrite. He can be reached at: almata@hotmail.com

 

 

 

 

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