O novo século americano

 

 


Arundhati Roy

Este artigo foi adaptado a partir do discurso de Arundhati Roy na abertura da plenária do Fórum Social Mundial de Mumbai, em 16 de janeiro de 2004.

22 de janeiro de 2004

The Nation

commondreams.org

Tradução Imediata

Em janeiro de 2003, milhares de nós, provenientes de todo o mundo, nos reunimos em Porto Alegre, Brasil, e declaramos, reiteramos, que "Um Outro Mundo É Possível". Alguns milhares de milhas ao norte, em Washington, George W. Bush e seus assistentes estavam pensando a mesma coisa.

Nosso projeto era o Fórum Social Mundial. O deles – aquilo que muitos chamam de Projeto para o Novo Século Americano.

Nas grandes cidades da Europa e da América, onde até alguns anos atrás essas coisas eram apenas sussurradas, agora as pessoas estão falando abertamente sobre o lado bom do imperialismo e a necessidade de um império forte para policiar um mundo indisciplinado. Os novos missionários querem a ordem às custas da justiça. Disciplina às custas da dignidade. E supremacia a qualquer preço. Ocasionalmente, alguns de nós são convidados para "debater" a questão em plataformas "neutras", pela mídia corporativa. Debater o imperialismo é um pouco como debater os prós e os contras de um estupro. O que podemos dizer? Que sentimos falta disso?

Seja como for, o Novo Imperialismo já está sobre nós. É uma versão remodelada, aerodinamizada daquela que conhecíamos antigamente. Pela primeira vez na história, um único império com um arsenal de armas que poderia obliterar o mundo em apenas uma tarde tem uma hegemonia econômica e militar completa e unipolar, Ele usa armas diferentes para arrombar diferentes mercados. Não há um único país nesta terra de Deus que não esteja preso no emaranhado dos mísseis cruise dos EUA e no talão de cheques do FMI. O modelo da Argentina, para quem quiser ser o garoto propaganda do capitalismo neoliberal, o Iraque para quem for a ovelha negra. Os países pobres que têm um valor geopoliticamente estratégico para o Império, ou que têm um "mercado" de qualquer tamanho, uma infra-estrutura que posa ser privatizada, ou, "Deus nos livre", recursos naturais de valor – petróleo, ouro, diamantes, cobalto, carvão – devem apenas cumprir ordens, caso contrário, tornam-se alvos militares. Aqueles com as maiores reservas de riqueza natural são os que têm o maior risco. A menos que abram mão de seus recursos, cedendo-os de bom grado à máquina corporativa, será fomentada a agitação civil ou declarada guerra.

Nesta nova era do império, quando nada é o que parece ser, executivos de companhias preocupadas têm a permissão de influenciar as decisões de política exterior. O Center for Public Integrity de Washington descobriu que pelo menos nove entre os trinta membros da Comissão para a Política de Defesa da Administração Bush estavam associados a empresas que foram brindadas com contratos militares pelo valor de US$ 76 bilhões, entre 2001 e 2002. George Shultz, ex-secretário de Estado, foi presidente do Comitê para a Liberação do Iraque. Ele também faz parte do Conselho de diretores do Bechtel Group. Quando perguntado sobre o conflito de interesses no caso da guerra do Iraque, disse: "Não sei se a Bechtel se beneficiaria particularmente com isso. Mas se houver trabalho a ser feito, a Bechtel é o tipo de companhia que poderia fazê-lo. Mas ninguém deveria ver isso como uma possível fonte de benefício". Em abril de 2003, a Bechtel assinou um contrato para a reconstrução do Iraque de US$ 680 milhões.

Esse modelo brutal tem sido usado vez após outra em toda a América Latina, na África e na Ásia Central e Meridional. E custado milhões de vidas. Nem é preciso dizer que cada guerra que o Império declara se torna uma Guerra Justa. Isso, em grande parte, deve-se ao papel da mídia corporativa. É importante compreender que a mídia corporativa não apenas defende o projeto neoliberal. Ela é o projeto neoliberal. Não se trata de uma posição moral que eles escolheram assumir; é estrutural. É intrínseco à economia de como os meios de comunicação de massas funcionam.

A maioria das nações têm seus repugnantes segredinhos familiares. Assim, frequentemente, é necessário que a mídia minta. Está tudo na edição–o que é enfatizado e o que é ignorado. Digamos, por exemplo, que a Índia tenha sido escolhida como alvo de uma guerra justa. O fato de que cerca de 80.000 pessoas tenham sido assassinadas na Caxemira desde 1989, a maioria delas muçulmanas, a maioria delas executada pelas forças de segurança indiana (uma média de 6 mil mortes por ano); o fato de que em fevereiro e março de 2002 mais de 2.000 muçulmanos tenham sido assassinados nas ruas de Gujarat, de que as mulheres tenham sido estupradas por gangues e as crianças queimadas vivas e 150.000 pessoas expulsas de suas casas enquanto a polícia e a administração ficou olhando e algumas vezes participando; o fato de que ninguém tenha sido punido por esses crimes e que o governo que os supervisionou tenha sido reeleito…. Tudo isso daria manchetes perfeitas nos jornais internacionais, no caso de um eventual arranque para a guerra.

Em um piscar de olhos, nossas cidades seriam arrasadas pelos mísseis cruise, nossos vilarejos cercados com arame farpado, os soldados dos EUA patrulhariam nossas ruas, e Narendra Modi, Pravin Togadia ou qualquer outro de nossos fanáticos populares, como Saddam Hussein, ficariam em custódia dos EUA, tendo seus cabelos checados à cata de piolhos e as obturações de seus dentes examinadas no horário nobre da TV.

Mas desde que nossos "mercados" estejam abertos, desde que corporações como a Enron, a Bechtel, a Halliburton e a Arthur Andersen recebam de bandeja a possibilidade de assumir o controle de nossa infra-estrutura e abolir nossos empregos, nossos líderes "democraticamente eleitos" não precisarão ter qualquer receio de cruzar as linhas entre democracia, majoritarismo e fascismo.

O desejo louco do nosso governo de abandonar a orgulhosa posição da Índia de não alinhamento, sua pressa para ocupar uma posição na linha de frente na corrida para o Alinhamento Completo (a frase da moda é "aliado natural" – a Índia, Israel e os EUA são "aliados naturais"), deu-lhe o espaço para se tornar um regime repressivo sem comprometer sua legitimidade.

As vítimas de um governo não são somente as pessoas que são mortas ou encarceradas por ele. Devem ser incluídas entre as vítimas também as pessoas que são por ele destituídas, despojadas e condenadas à fome e privação. Milhões de pessoas foram destituídas devido aos projetos de "desenvolvimento". Nos últimos 55 anos, somente as grandes represas desapropriaram entre 33 milhões e 55 milhões na Índia. E essas pessoas não podem apelar para a justiça. Nos últimos dois anos tem havido uma série de incidentes nos quais a polícia abriu fogo a manifestantes pacíficos, a maioria dos quais eram adivasi e dalit. Mas quando se trata dos pobres, e em particular das comunidades dalit e adivasi, eles acabam sendo mortos por invadirem terras florestais, e mortos quando tentam proteger as terras florestais das invasões – pelas represas, minas, siderúrgicas e outros projetos de "desenvolvimento". Em quase todos os casos em que a polícia abriu fogo, a estratégia do governo tem sido a de dizer que os tiros foram provocados por atos de violência. Aqueles que foram alvo dos tiros são imediatamente chamados de militantes.

Em todo o país, milhares de inocentes, incluindo menores de idade, foram detidos sob a Lei de Prevenção ao Terrorismo e estão presos indefinidamente e sem julgamento. Na era da Guerra contra o Terror, a pobreza tem sido falsamente confundida com o terrorismo. Na era da globalização corporativa, a pobreza é crime. Manifestar-se contra um maior empobrecimento é terrorismo. E agora o nosso Supremo Tribunal diz que fazer greve é crime, naturalmente. As saídas estão sendo vedadas.

Como para o Velho Imperialismo, o sucesso do Novo Imperialismo depende de uma rede de agentes – as elites corruptas locais que servem ao Império. Todos conhecemos a sórdida história da Enron na Índia. O governo Maharashtra da época assinou um acordo de compra de energia que dava à Enron lucros que alcançavam 60 por cento de todo o orçamento para o desenvolvimento rural da Índia. Uma única companhia americana obteve uma garantia de lucros equivalente aos fundos para o desenvolvimento de infra-estrutura para cerca de 500 milhões de pessoas!

Diferentemente dos velhos tempos, o Novo Imperialismo não precisa arrastar-se pelos trópicos, arriscando contrair malária, diarréia ou morte prematura. O Novo Imperialismo pode ser conduzido via e-mail. O racismo vulgar e com a mão na massa do Velho Imperialismo está fora de moda. A pedra angular do Novo Imperialismo é o Novo Racismo.

A melhor alegoria para o Novo Racismo é a tradição do "turkey pardoning" ("perdão para o peru") nos Estados Unidos. A cada ano, desde 1947, a National Turkey Federation tem oferecido ao Presidente dos Estados Unidos um peru para o Thanksgiving (Dia de Ação de Graças). Todos os anos, num show da magnanimidade presidencial, o Presidente poupa a vida de um pássaro em particular (e come um outro). Depois de ser agraciado com o perdão presidencial, o Peru/Perua Escolhido/a é enviado para o Frying Pan Park na Virgínia para viver sua vida ao natural. Os 50 milhões de perus/peruas restantes, criados para o Thanksgiving são abatidos e comidos no Dia de Ação de Graças. A ConAgra Foods, a empresa que conseguiu ganhar o contrato para fornecer o Peru/Perua Presidencial, diz que adestra os pássaros felizardos para serem sociáveis interagirem com dignatários, estudantes e imprensa. (Em breve, os perus/peruas estarão até falando inglês!)

É assim que funciona o Novo Racismo da era corporativa. Uns poucos perus/peruas cuidadosamente adestrados –as elites locais dos vários países, uma comunidade de imigrantes ricos, banqueiros investidores, os ocasionais Colin Powell ou Condoleezza Rice, alguns cantores, alguns escritores (como eu) – obtêm absolvição e um passe para o Frying Pan Park. Os milhões de pessoas restantes perdem seus empregos, são despejados de suas casas, passam a ter a água e a eletricidade cortada e morrem de AIDS. Basicamente, acabam na panela. Mas as Aves Felizardas do Frying Pan Park estão passando bem. Algumas delas até trabalham para o FMI e a OMC – de forma que, quem ousaria acusar essas organizações de serem anti-perus/peruas? Alguns trabalham como membros do Conselho para a Escolha dos Perus/Peruas – assim, quem poderia dizer que os perus são contra o Thanksgiving? Eles participam da celebração! Quem pode dizer que os pobre são anti-globalização corporativa? Há uma corrida para ingressar no Frying Pan Park. E daí, que a maioria perece no decorrer do percurso?

Como parte do projeto do Novo Racismo, também temos o Novo Genocídio. O Novo Genocídio nessa nova era de interdependência econômica pode ser facilitado pelas sanções econômicas. O Novo Genocídio significa criar condições que levem à morte em massa sem que, na realidade, se matem diretamente as pessoas. Denis Halliday, que era o coordenador humanitário da ONU no Iraque entre 1997 e 1998 (depois do que resignou, por repugnância), usava o termo genocídio para descrever as sanções no Iraque. No Iraque, as sanções superaram os melhores esforço de Saddam Hussein, tirando a vida de mais de meio milhão de crianças.

Nessa nova era, o apartheid como política formal é antiquada e desnecessária. Os instrumentos internacionais de comércio e finanças supervisionam um sistema complexo de leis de comércio multilaterais e acordos financeiros que mantêm os pobres em seus bantustans, de qualquer jeito. O único propósito desses instrumentos é institucionalizar a iniquidade. Por qual outra razão os EUA tributariam uma peça de vestuário feita por um fabricante de Bangladesh vinte vezes mais do que uma roupa feita na Grã-Bretanha? Por qual outra razão os países que cultivam cacau, como a Costa do Marfim e Gana, são taxados proibitivamente se tentam produzir chocolate? Por qual outra razão os países que cultivam 90 por cento do cacau do mundo todo produzem somente 5 por cento do chocolate mundial? Por qual outra razão os países ricos que gastam mais um bilhão de dólares por dia em subsídios a agricultores exigem que os países pobres como a Índia suprimam todos os subsídios agrícolas, inclusive a eletricidade subsidiada? Por qual outra razão, depois de terem sido pilhados por regimes colonizadores por mais de meio século, as antigas colônias agravam seu endividamento com relação àqueles mesmos regimes, repagando aos mesmos cerca de US$ 382 bilhões por ano?

Por todas essas razões, o descarrilhar dos acordos de comércio em Cancun foi fundamental para nós. Embora nossos governos tentem dar o crédito a si próprios, nós sabemos que isso foi o resultado de anos de luta da parte de muitos milhões de pessoas em muitos, muitos países. O que Cancun nos ensinou é que para infligir danos verdadeiros e forçar uma mudança radical, é vital que os movimentos de resistência local façam alianças internacionais. De Cancun, aprendemos a importância de globalizar a resistência.

Nenhuma nação pode apoiar sozinha o projeto de globalização corporativa. Vez após outra temos visto o que ocorre com o projeto neoliberal; os heróis de nossa era são, de repente, diminuídos. Homens extraordinários e carismáticos, gigantes da oposição, quando chegam ao poder e se tornam homens de estado acabam ficando sem poder no cenário mundial. Estou pensando no Presidente Lula do Brasil. Lula foi o herói do Fórum Social Mundial do ano passado. Este ano, está ocupado implementando as diretrizes do FMI, reduzindo os benefícios de aposentadoria e expulsando os radicais do Partido dos Trabalhadores. Estou pensando também no ex-presidente da África do Sul, Nelson Mandela. Dois anos depois de tomar posse, em 1994, seu governo teve que se ajoelhar ao Deus Mercado. E instituiu um extenso programa de privatizações e ajustes estruturais que deixou milhões de pessoas sem casa, sem trabalho e sem água e eletricidade.

Porque acontece isso? Não adianta nada batermos os nossos peitos e nos sentirmos traídos. Lula e Mandela são homens magníficos. Mas o momento que atravessam a linha entre oposição e governo, tornam-se reféns de um espectro de ameaças – entre elas, as mais malévolas são a ameaça de fuga do capital, que pode destruir qualquer governo em poucas horas. Imaginar-se que o carisma pessoal de um líder e o currículo de luta vai brecar o cartel corporativo quer dizer não entender como o capitalismo funciona, ou melhor, como o poder funciona. A mudança radical não pode ser negociada por governos; somente as pessoas podem impô-la.

No Fórum Social Mundial, algumas das melhores cabeças do mundo todo se reúnem para trocar idéias sobre o que está ocorrendo em nossa volta. Essas conversas refinam a nossa visão quanto ao tipo de mundo pelo qual queremos lutar. É um processo vital que não deve ser debilitado. Entretanto, se todas as nossas energias forem desviadas neste processo às custas de uma ação política real, então o FSM, o qual tem um papel tão crucial no movimento pela justiça global, corre o risco de se tornar um ativo para os nossos inimigos. O que precisamos discutir urgentemente são as estratégias de resistência. Precisamos atingir os alvos reais, declarar guerras reais e infligir danos reais. A marcha do sal de Gandhi não era apenas teatro político. Quando, num simples ato de desafio, milhares de indianos marcharam ao mar e fizeram o seu próprio sal, eles desrespeitaram as leis tributárias relativas ao sal. Foi um ataque direto ao sistema econômico do Império Britânico. Foi real. Embora nosso movimento tenha conquistado importantes vitórias, não devemos permitir que a resistência não violenta se atrofie num teatro meramente político, ineficaz e auto-gratificante. Trata-se uma arma preciosa que deve ser continuamente repensada. Não podemos deixar que se torne mero espetáculo, uma mera oportunidade de foto para a mídia.

Foi maravilhoso o que aconteceu em 15 de fevereiro do ano passado, numa demonstração espetacular de moralidade pública 10 milhões de pessoas nos cinco continentes marcharam contra a guerra no Iraque. Foi maravilhoso, mas não foi suficiente. 15 de fevereiro foi um fim de semana. Ninguém precisou perder nem um dia de trabalho. Mas os protestos em dias feriados não param uma guerra. George Bush sabe disso. A confiança com a qual desprezou a impressionante opinião pública deveria ser uma lição para todos nós. Bush acredita que o Iraque possa ser ocupado e colonizado como tem sido o Afeganistão, como tem sido o Tibete, a Chechnia, como foi o Timor Leste, como tem sido a Palestina. Ele acha que tudo o que precisa fazer é fica de cócoras e esperar que a mídia, impulsionada pelas crises, e tendo esgotado essa crise presente, se canse e parta para outra. Em breve, a carcaça escorrega da prateleira dos best sellers e todos nós perderemos interesse. Ou assim ele espera.

Nosso movimento precisa de uma vitória mais importante, global. Não basta estarmos com a razão. Às vezes, mesmo que para testar nossa força de vontade, é importante ganhar alguma coisa. Para ganhar algo, precisamos estar de acordo em alguns pontos. Esses pontos não precisam consistir numa ideologia abrangente e pré-estabelecida nem numa lealdade inabalável a alguma forma especeifica de resistência, excluindo-se todo o resto. Pode ser uma agenda mínima.

Se todos nós formos efetivamente contra o imperialismo e contra o projeto do neoliberalismo, então porque não voltarmos nosso olhar para o Iraque? O Iraque é o inevitável resultado de ambos. Muitos ativistas anti-guerra se recolheram confusos desde a captura de Saddam Hussein. O mundo não ficou melhor sem o Saddam Hussein? eles se perguntam timidamente.

Vamos olhar para isso de frente, de uma vez por todas. Para aplaudir a captura de Saddam Hussein pelo exército dos EUA, e portanto, retrospectivamente, justificar a invasão e a ocupação do Iraque, é como idolatrar Jack o Estripador por ter tirado as vísceras do Estrangulador de Boston. E isso depois de um quarto de século no qual Estripador-Estrangulador formavam uma perfeita parceria. É uma querela doméstica. São parceiros de negócios que se desentenderam depois de um negócio sujo. O Jack é o Presidente.

Assim, se somos contra o imperialismo, deveríamos concordar que somos contra a ocupação pelos EUA e que acreditamos que os EUA deveriam se retirar do Iraque e pagar reparações ao povo iraquiano pelos danos que a guerra infligiu?

Como podemos começar a montar a nossa resistência? Vamos começar com algo verdadeiramente pequeno. A questão não é apoiar a resistência no Iraque contra a ocupação ou discutir quem exatamente constitui a resistência. (Será ela formada pelo velhos assassinos Baathistas, ou pelos fundamentalistas islâmicos?)

Nós precisamos nos tornar a resistência global à ocupação.

Nossa resistência tem que começar com a recusa de aceitar a legitimidade da ocupação do Iraque pelos EUA. Significa agir de modo a tornar materialmente impossível para o Império alcançar seus objetivos. Significa que os soldados deveriam recusar de lutar, os reservistas deveriam recusar de servir, os trabalhadores deveriam carregar os navios e os aviões com armas. Certamente, significa que em países como a Índia e o Paquistão, devemos bloquear os planos do governo dos EUA de ter soldados da Índia e do Paquistão sendo enviados para o Iraque, para fazer o trabalho de limpar os estragos que fizeram.

Eu sugiro que escolhamos, de alguma forma, duas das maiores corporações que estão lucrando com a destruição do Iraque. Então, poderíamos listar cada projeto em que elas estejam envolvidas. Poderíamos localizar seus escritórios em cada cidade e cada país do mundo. E irmos atrás deles. Poderíamos obrigá-las a fechar suas portas. É uma questão de trazermos nossa sabedoria coletiva e experiências com conflitos passados, direcionando-as a um alvo único. É uma questão de vontade de vencer.

O Projeto para o Novo Século Americano procura perpetuar a iniqüidade e estabelecer a hegemonia americana a qualquer preço, mesmo se esse preço for apocalíptico. O Fórum Social Mundial reivindica justiça e sobrevivência.

Por essas razões, devemos nos considerar em guerra.

Copyright © 2004 The Nation

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Published on Thursday, January 22, 2004 by The Nation

The New American Century

This article was adapted from Arundhati Roy's January 16 speech to the opening plenary of the World Social Forum in Mumbai.

by Arundhati Roy

 

In January 2003 thousands of us from across the world gathered in Porto Alegre in Brazil and declared--reiterated--that "Another World Is Possible." A few thousand miles north, in Washington, George W. Bush and his aides were thinking the same thing.

Our project was the World Social Forum. Theirs--to further what many call the Project for the New American Century.

In the great cities of Europe and America, where a few years ago these things would only have been whispered, now people are openly talking about the good side of imperialism and the need for a strong empire to police an unruly world. The new missionaries want order at the cost of justice. Discipline at the cost of dignity. And ascendancy at any price. Occasionally some of us are invited to "debate" the issue on "neutral" platforms provided by the corporate media. Debating imperialism is a bit like debating the pros and cons of rape. What can we say? That we really miss it?

In any case, New Imperialism is already upon us. It's a remodeled, streamlined version of what we once knew. For the first time in history, a single empire with an arsenal of weapons that could obliterate the world in an afternoon has complete, unipolar, economic and military hegemony. It uses different weapons to break open different markets. There isn't a country on God's earth that is not caught in the cross-hairs of the American cruise missile and the IMF checkbook. Argentina's the model if you want to be the poster boy of neoliberal capitalism, Iraq if you're the black sheep. Poor countries that are geopolitically of strategic value to Empire, or have a "market" of any size, or infrastructure that can be privatized, or, God forbid, natural resources of value--oil, gold, diamonds, cobalt, coal--must do as they're told or become military targets. Those with the greatest reserves of natural wealth are most at risk. Unless they surrender their resources willingly to the corporate machine, civil unrest will be fomented or war will be waged.

In this new age of empire, when nothing is as it appears to be, executives of concerned companies are allowed to influence foreign policy decisions. The Center for Public Integrity in Washington found that at least nine out of the thirty members of the Bush Administration's Defense Policy Board were connected to companies that were awarded military contracts for $76 billion between 2001 and 2002. George Shultz, former Secretary of State, was chairman of the Committee for the Liberation of Iraq. He is also on the board of directors of the Bechtel Group. When asked about a conflict of interest in the case of war in Iraq he said, "I don't know that Bechtel would particularly benefit from it. But if there's work to be done, Bechtel is the type of company that could do it. But nobody looks at it as something you benefit from." In April 2003, Bechtel signed a $680 million contract for reconstruction.

This brutal blueprint has been used over and over again across Latin America, in Africa and in Central and Southeast Asia. It has cost millions of lives. It goes without saying that every war Empire wages becomes a Just War. This, in large part, is due to the role of the corporate media. It's important to understand that the corporate media don't just support the neoliberal project. They are the neoliberal project. This is not a moral position they have chosen to take; it's structural. It's intrinsic to the economics of how the mass media work.

Most nations have adequately hideous family secrets. So it isn't often necessary for the media to lie. It's all in the editing--what's emphasized and what's ignored. Say, for example, India was chosen as the target for a righteous war. The fact that about 80,000 people have been killed in Kashmir since 1989, most of them Muslim, most of them by Indian security forces (making the average death toll about 6,000 a year); the fact that in February and March of 2002 more than 2,000 Muslims were murdered on the streets of Gujarat, that women were gang-raped and children were burned alive and 150,000 driven from their homes while the police and administration watched and sometimes actively participated; the fact that no one has been punished for these crimes and the government that oversaw them was re-elected...all of this would make perfect headlines in international newspapers in the run-up to war.

Next thing we know, our cities will be leveled by cruise missiles, our villages fenced in with razor wire, US soldiers will patrol our streets, and Narendra Modi, Pravin Togadia or any of our popular bigots will, like Saddam Hussein, be in US custody having their hair checked for lice and the fillings in their teeth examined on prime-time TV.

But as long as our "markets" are open, as long as corporations like Enron, Bechtel, Halliburton and Arthur Andersen are given a free hand to take over our infrastructure and take away our jobs, our "democratically elected" leaders can fearlessly blur the lines between democracy, majoritarianism and fascism.

Our government's craven willingness to abandon India's proud tradition of being non-aligned, its rush to fight its way to the head of the queue of the Completely Aligned (the fashionable phrase is "natural ally"--India, Israel and the United States are "natural allies"), has given it the leg room to turn into a repressive regime without compromising its legitimacy.

A government's victims are not only those it kills and imprisons. Those who are displaced and dispossessed and sentenced to a lifetime of starvation and deprivation must count among them too. Millions of people have been dispossessed by "development" projects. In the past fifty-five years, big dams alone have displaced between 33 million and 55 million in India. They have no recourse to justice. In the past two years there have been a series of incidents in which police have opened fire on peaceful protesters, most of them Adivasi and Dalit. When it comes to the poor, and in particular Dalit and Adivasi communities, they get killed for encroaching on forest land, and killed when they're trying to protect forest land from encroachments--by dams, mines, steel plants and other "development" projects. In almost every instance in which the police opened fire, the government's strategy has been to say the firing was provoked by an act of violence. Those who have been fired upon are immediately called militant

Across the country, thousands of innocent people, including minors, have been arrested under the Prevention of Terrorism Act and are being held in jail indefinitely and without trial. In the era of the War against Terror, poverty is being slyly conflated with terrorism. In the era of corporate globalization, poverty is a crime. Protesting against further impoverishment is terrorism. And now our Supreme Court says that going on strike is a crime. Criticizing the court is a crime too, of course. They're sealing the exits.

Like Old Imperialism, New Imperialism relies for its success on a network of agents--corrupt local elites who service Empire. We all know the sordid story of Enron in India. The then-Maharashtra government signed a power purchase agreement that gave Enron profits that amounted to 60 percent of India's entire rural development budget. A single American company was guaranteed a profit equivalent to funds for infrastructural development for about 500 million people!

Unlike in the old days, the New Imperialist doesn't need to trudge around the tropics risking malaria or diarrhea or early death. New Imperialism can be conducted on e-mail. The vulgar, hands-on racism of Old Imperialism is outdated. The cornerstone of New Imperialism is New Racism.

The best allegory for New Racism is the tradition of "turkey pardoning" in the United States. Every year since 1947, the National Turkey Federation has presented the US President with a turkey for Thanksgiving. Every year, in a show of ceremonial magnanimity, the President spares that particular bird (and eats another one). After receiving the presidential pardon, the Chosen One is sent to Frying Pan Park in Virginia to live out its natural life. The rest of the 50 million turkeys raised for Thanksgiving are slaughtered and eaten on Thanksgiving Day. ConAgra Foods, the company that has won the Presidential Turkey contract, says it trains the lucky birds to be sociable, to interact with dignitaries, school children and the press. (Soon they'll even speak English!)

That's how New Racism in the corporate era works. A few carefully bred turkeys--the local elites of various countries, a community of wealthy immigrants, investment bankers, the occasional Colin Powell or Condoleezza Rice, some singers, some writers (like myself)--are given absolution and a pass to Frying Pan Park. The remaining millions lose their jobs, are evicted from their homes, have their water and electricity connections cut, and die of AIDS. Basically they're for the pot. But the Fortunate Fowls in Frying Pan Park are doing fine. Some of them even work for the IMF and the WTO--so who can accuse those organizations of being antiturkey? Some serve as board members on the Turkey Choosing Committee--so who can say that turkeys are against Thanksgiving? They participate in it! Who can say the poor are anti-corporate globalization? There's a stampede to get into Frying Pan Park. So what if most perish on the way?

As part of the project of New Racism we also have New Genocide. New Genocide in this new era of economic interdependence can be facilitated by economic sanctions. New Genocide means creating conditions that lead to mass death without actually going out and killing people. Denis Halliday, who was the UN humanitarian coordinator in Iraq between 1997 and 1998 (after which he resigned in disgust), used the term genocide to describe the sanctions in Iraq. In Iraq the sanctions outdid Saddam Hussein's best efforts by claiming more than half a million children's lives.

In the new era, apartheid as formal policy is antiquated and unnecessary. International instruments of trade and finance oversee a complex system of multilateral trade laws and financial agreements that keep the poor in their bantustans anyway. Its whole purpose is to institutionalize inequity. Why else would it be that the US taxes a garment made by a Bangladeshi manufacturer twenty times more than a garment made in Britain? Why else would it be that countries that grow cocoa beans, like the Ivory Coast and Ghana, are taxed out of the market if they try to turn it into chocolate? Why else would it be that countries that grow 90 percent of the world's cocoa beans produce only 5 percent of the world's chocolate? Why else would it be that rich countries that spend over a billion dollars a day on subsidies to farmers demand that poor countries like India withdraw all agricultural subsidies, including subsidized electricity? Why else would it be that after having been plundered by colonizing regimes for more than half a century, former colonies are steeped in debt to those same regimes and repay them some $382 billion a year?

For all these reasons, the derailing of trade agreements at Cancún was crucial for us. Though our governments try to take the credit, we know that it was the result of years of struggle by many millions of people in many, many countries. What Cancún taught us is that in order to inflict real damage and force radical change, it is vital for local resistance movements to make international alliances. From Cancún we learned the importance of globalizing resistance.

No individual nation can stand up to the project of corporate globalization on its own. Time and again we have seen that when it comes to the neoliberal project, the heroes of our times are suddenly diminished. Extraordinary, charismatic men, giants in the opposition, when they seize power and become heads of state, are rendered powerless on the global stage. I'm thinking here of President Lula of Brazil. Lula was the hero of the World Social Forum last year. This year he's busy implementing IMF guidelines, reducing pension benefits and purging radicals from the Workers' Party. I'm thinking also of the former president of South Africa, Nelson Mandela. Within two years of taking office in 1994, his government genuflected with hardly a caveat to the Market God. It instituted a massive program of privatization and structural adjustment that has left millions of people homeless, jobless and without water and electricity.

Why does this happen? There's little point in beating our breasts and feeling betrayed. Lula and Mandela are, by any reckoning, magnificent men. But the moment they cross the floor from the opposition into government they become hostage to a spectrum of threats--most malevolent among them the threat of capital flight, which can destroy any government overnight. To imagine that a leader's personal charisma and a c.v. of struggle will dent the corporate cartel is to have no understanding of how capitalism works or, for that matter, how power works. Radical change cannot be negotiated by governments; it can only be enforced by people.

At the World Social Forum some of the best minds in the world come together to exchange ideas about what is happening around us. These conversations refine our vision of the kind of world we're fighting for. It is a vital process that must not be undermined. However, if all our energies are diverted into this process at the cost of real political action, then the WSF, which has played such a crucial role in the movement for global justice, runs the risk of becoming an asset to our enemies. What we need to discuss urgently is strategies of resistance. We need to aim at real targets, wage real battles and inflict real damage. Gandhi's salt march was not just political theater. When, in a simple act of defiance, thousands of Indians marched to the sea and made their own salt, they broke the salt tax laws. It was a direct strike at the economic underpinning of the British Empire. It was real. While our movement has won some important victories, we must not allow nonviolent resistance to atrophy into ineffectual, feel-good, political theater. It is a very precious weapon that must be constantly honed and reimagined. It cannot be allowed to become a mere spectacle, a photo opportunity for the media.

It was wonderful that on February 15 last year, in a spectacular display of public morality, 10 million people on five continents marched against the war on Iraq. It was wonderful, but it was not enough. February 15 was a weekend. Nobody had to so much as miss a day of work. Holiday protests don't stop wars. George Bush knows that. The confidence with which he disregarded overwhelming public opinion should be a lesson to us all. Bush believes that Iraq can be occupied and colonized as Afghanistan has been, as Tibet has been, as Chechnya is being, as East Timor once was and Palestine still is. He thinks that all he has to do is hunker down and wait until a crisis-driven media, having picked this crisis to the bone, drops it and moves on. Soon the carcass will slip off the bestseller charts, and all of us outraged folks will lose interest. Or so he hopes.

This movement of ours needs a major, global victory. It's not good enough to be right. Sometimes, if only in order to test our resolve, it's important to win something. In order to win something, we need to agree on something. That something does not need to be an overarching preordained ideology into which we force-fit our delightfully factious, argumentative selves. It does not need to be an unquestioning allegiance to one or another form of resistance to the exclusion of everything else. It could be a minimum agenda.

If all of us are indeed against imperialism and against the project of neoliberalism, then let's turn our gaze on Iraq. Iraq is the inevitable culmination of both. Plenty of antiwar activists have retreated in confusion since the capture of Saddam Hussein. Isn't the world better off without Saddam Hussein? they ask timidly.

Let's look this thing in the eye once and for all. To applaud the US Army's capture of Saddam Hussein, and therefore in retrospect justify its invasion and occupation of Iraq, is like deifying Jack the Ripper for disemboweling the Boston Strangler. And that after a quarter-century partnership in which the Ripping and Strangling was a joint enterprise. It's an in-house quarrel. They're business partners who fell out over a dirty deal. Jack's the CEO.

So if we are against imperialism, shall we agree that we are against the US occupation and that we believe the United States must withdraw from Iraq and pay reparations to the Iraqi people for the damage that the war has inflicted?

How do we begin to mount our resistance? Let's start with something really small. The issue is not about supporting the resistance in Iraq against the occupation or discussing who exactly constitutes the resistance. (Are they old killer Baathists, are they Islamic fundamentalists?)

We have to become the global resistance to the occupation.

Our resistance has to begin with a refusal to accept the legitimacy of the US occupation of Iraq. It means acting to make it materially impossible for Empire to achieve its aims. It means soldiers should refuse to fight, reservists should refuse to serve, workers should refuse to load ships and aircraft with weapons. It certainly means that in countries like India and Pakistan we must block the US government's plans to have Indian and Pakistani soldiers sent to Iraq to clean up after them.

I suggest we choose by some means two of the major corporations that are profiting from the destruction of Iraq. We could then list every project they are involved in. We could locate their offices in every city and every country across the world. We could go after them. We could shut them down. It's a question of bringing our collective wisdom and experience of past struggles to bear on a single target. It's a question of the desire to win.

The Project for the New American Century seeks to perpetuate inequity and establish American hegemony at any price, even if it's apocalyptic. The World Social Forum demands justice and survival.

For these reasons, we must consider ourselves at war.

Arundhati Roy, the author of The God of Small Things and War Talk, lives in New Delhi, India. A collection of interviews with David Barsamian, The Checkbook and the Cruise Missile, and a new essay collection, An Ordinary Person's Guide to Empire, are forthcoming from South End Press.

Copyright © 2004 The Nation

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